sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Na tribo




2001: intoxicados por uma anti-mão-de-obra FHC, escrevi isso:

—...O que vem a ser o trabalho?

Um professor fez tal pergunta em minha sala e acho eu já estava no colegial. Ninguém sabia responder, mas lembrei dos índios, que tinham uma forma diferente de viver, que parecia bem mais prazeroso do que a nossa, os brancos ocidentais. Para mim o índio era e é, pós-tecnológico.

Claro, ele não aceitou minha idéia. É bem verdade que eu não sabia articular as próprias idéias, ainda mais sobre o trabalho, sobre esse dilema da alma humana. Certa vez um amigo mais velho me dissera que era inaceitável as pessoas terem de trabalhar para conseguir alimento. “A Terra sempre nos deu seus frutos e nunca cobrou nada, a não ser, carinho”. Fiquei com isso na cabeça e comecei a pensar se ele não estava certo, enquanto falava dos índios ao professor. O que eu queria dizer era o seguinte:

“...Trabalhar é um gesto humano. É a necessidade de se construir algo, de transformar o mundo que nos cerca. O Homem foi ficando especialista nisso, foi tomando o lugar da natureza e começou a trabalhar cada vez mais.

Houve um tempo em que se trabalhava naturalmente, onde cada um se organizava de acordo com as próprias forças e necessidades. O tempo era só o tempo, não havia sido associado ao fator trabalho; ainda não havia se transformado em sinônimo de dinheiro. O Homem tem uma tendência a cair do paraíso e passou a trabalhar cada vez mais, sem parar. A urgência passou a ser tão grande, que alguns serviços deixaram de existir. Cada vez mais era preciso gerar rapidez e qualidade para se comprar as mesmas coisas. Resultado: nunca se faltou tanto trabalho no mundo e nunca houve tanta riqueza acumulada. Acho que algo está errado.

O trabalho pode dignificar o Homem, pois o faz sentir útil e integrado a uma sociedade. Mas então por que falta trabalho? A tão desejada ordem, sonhada pelos poderosos, seria alcançada com postos de trabalho. Será que é tão difícil assim, entender o caso? Talvez o mundo já esteja pronto e não se precise mais de trabalho, de mão de obra. É a única explicação.

Imagine uma pessoa pensando assim: —sim, eu penso, existo, tenho força e quero trabalhar!. Mas não acha trabalho. Há mais concorrentes do que vaga. Não basta querer trabalhar é preciso competir; o que é uma lástima. Há quem ache isso bonito e até faça palestras sobre o assunto”.

Quando encerrei a fala, ele desconversou. Foi para outro tópico. Eu não, continuei pensando nisso. Mais precisamente, na finalidade do trabalho. Pra que se trabalhava?

A primeira idéia pode ser a necessidade básica primordial humana: comida. A segunda, moradia. A terceira, diversão e posterior criação das futuras gerações. Acho que todos concordam. Tem também o quesito conforto e a vocação; também se trabalha por isso.

Passamos a trabalhar horas e mais horas para depois, num breve espaço de tempo, curtirmos em algum balneário, o que se veio a chamar: férias. — conquista dos partidos de esquerda, tão abominados pelos burgueses que adoram gastar o lucro nos mesmos balneários, durante suas férias. Ou seja, todo mundo que trabalha gosta de férias. Peça alguém para descrever férias ideais.

—Hummm,... acho que duas árvores, uma rede esticada, uma praia ali na frente, crianças brincando alegres, nenhum compromisso com o tempo, esquecimento de obrigações, ou seja, paraíso.— alguns podem mudar a descrição do espaço geográfico, mas a essência é a mesma: compromisso zero.

Com base nesses dados, descobri que o índio já fazia isso, sem passar pela agonia filosófica do questionamento. É essa a diferença. O homem branco constrói os próprios grilhões, fica amargurado, produz arte e interpretações sobre si mesmo e se liberta virtualmente em férias programadas. O índio não, faz tudo o que tem de fazer, quando acha que tem de fazer e pronto. Não constrói casa de tijolos, pois cada hora quer estar numa praia. A moradia não lhe prende. Ele não precisa voltar. Tem como elemento vegetal representativo, a mandioca. O vegetal mais fácil de se plantar, basta enfiar o caule na terra, a raiz ela faz depois. Até crianças podem fazer o troço. Se houvesse um branco entre os índios, ele criaria um sistema de ensino para se chegar ao plantio com mais qualidade. Só quem tivesse mestrado em plantio de mandioca, poderia exercer a função. Ou seja, seria um sucesso só.

Pode parecer doidera, mas índio não sofre nas segundas-feiras.


4 comentários:

  1. Gostaria de poder viver do ócio criativo...Pura
    utopia...Sou Técnico químico e estou na função desde l986.Tento trabalhar com seriedade mas sempre alegre.tenho tido alto e baixos na profissão.Mas aprendi com o velho Buk logo após perder um bom trabalho.Comprei Factótum e estava lá nas
    primeiras páginas:"...não bastava que você fizesse
    seu trabalho.Era preciso mostrar interesse,se possível até paixão por ele."
    Trabalho por necessidade e por sorte trabalho na
    área que escolhi quando estava bêbado.Éramos apenas treze alunos escolhemos fazer o curso na mesa de um boteco perto do colégio.Não sei o que
    aconteceu com os outros...Só posso dizer que um ano após terminar o curso e já trabalhando na área encontrei um dos professores de química.Ele precisava de alguém da turma para indicar para uma boa vaga de emprego.Pedi a ele
    que me indicasse e francamente ele disse que eu não servia.iria decepcioná-lo eh eh.Queria ver a cara dele hoje ao ver o meu Currículo e vasta experiência na área de tratamento de minérios.

    ResponderExcluir
  2. o ócio é também minha meta. eh eh eh

    mas vc disse tudo: não basta ser bom no que vc faz, é preciso dementrar alegria...em sofrer

    ResponderExcluir
  3. deois que li seu poema, acídia, concordei em número e grau com sua professora de geografia, vc é mais um beat do que um químico; se bem um beat é um químico daquilo que falta à pasmacera do mundo...eh eh eh

    ResponderExcluir
  4. A professora de geografia de nome Lúcia é um dos
    motivos de eu fazer versos.Eu tinha quinze anos e
    adaptei uns versos lidos num jornalzinho de um Banco pra distinta e gostosa professora que acreditava no meu potencial um dia eu conto o resto mas o poema,que uma amiga de sala à època
    de nome Sandra escreveu para mim no quadro-negro
    que era verde-oliva era assim:Lúcia entra na sala.Contente e feliz.Numa mão a esponja.Na outra o giz.Com uma escreve,com a outra apaga feliz...A professora Lúcia entra na sala e se apaixona pelos versos.No outro dia ela me dá um cartão escrito assim:"Sou uma colecionadora de emoções e emoção igual a que você me fez sentir.Será difícil de ser superada.Assinado:Lúcia...

    ResponderExcluir