sábado, 24 de março de 2012

O corpo

Quadro: Amadeo-Modigliani


O grande problema das religiões é o corpo. Elas não sabem o que fazer com ele. No cristianismo é a glória maior estraçalhar-lo em sacrifício, em nome de um pecado original que nunca cometemos. Diga-se de passagem, o pecado original pertence ao judaísmo; eu não pertenço ao judaísmo. Sou Flamengo, brasileiro e amante da cerveja. Por isso não cometi pecado original nenhum e nunca fui tomado por um sentimento megalomaníaco de querer controlar o corpo do outro, que é meu irmão primata, que caminha sobre dois pés e em função da evolução das espécies.

No encontro ‘mundial’ da juventude, 2011, o Papa Bento XVI disse aos seminaristas que os mesmos devem resistir a um mundo cada vez mais sem Deus; que devem evitar o prazer, a ânsia pelo poder e manter o celibato. Difícil imaginar a vida de um papa sem conforto e poder; tenho certeza absoluta que mantém o celibato; já não tem mais idade para as chuvas hormonais humanas, demasiadamente humanas, característica da juventude.

Este, o hormônio, é outro imbróglio entre as religiões, com seus anciões, e seu criador; criador esse, que, se inevitavelmente criou o homem, o criou com hormônios. E quando explodem na primavera do corpo, colocam em prática o ditado popular, ‘água de morro abaixo, fogo de morro acima, ninguém segura’. Por isso a camisinha é um EPI (equipamento de proteção individual) e deve ser obrigatório nos bolsos dos jovens.

Mas voltando ao corpo, toda religião precisa de um; e nós, pobres humanos, além de mortais, com uma vida breve, estamos sempre sendo incomodados em nossas sonecas, pequenos porres e pequenas delícias com a intervenção de deuses, todos incorpóreos, mas ansiosos por nos controlar e saborear nosso mundo; porém, alguns querem proibir os desejos porque já são muito velhos; senis.

Veja bem: nas religiões afro-brasileiras as entidades descem para fumar um cigarrinho, beber uma cachaça, comer um cabrito; no cristianismo, Deus é um celibatário que proibiu a tudo e anda de mãos dadas com Yaveh, deus hebraico, e são os dois uma só entidade e que proíbem toda a felicidade ao longo do ano. Na mitologia grega os deuses têm filhos e filhas com as mortais e adoram o vinho. Porém, já estava esquecendo, deve-se lembrar que Cristo e Yaveh, nas festas modernas ocidentais, materializam-se, um em chocolate e esse último em ovo de galinha decorado; ainda há mais: ao fim do ano, o Deus cristão passa por mais uma materialização e se transforma em pernil; ou leitoa assada.

Mas eu nem tenho muito bronca dos deuses, pois são mais literatura do que personagens de uma sala da justiça, de onde vêem tudo e não fazem nada. Me incomoda mais aqueles que querem ser como esses deuses e se acham no direito de comandar os desígnios da humanidade, criticando o modo de vida alheio, mas que o vivem de maneira, digamos, por debaixo dos panos.