domingo, 6 de janeiro de 2013

Educação e racismo - Kabengele Munanga


Nascido no antigo Zaire, atual República Democrática do Congo, em 1942, o professor de Antropologia da Universidade de São Paulo Kabengele Munanga...
CartaCapital: O senhor afirma que é difícil definir quem é negro no Brasil. Por quê?
Kabengele Munanga: Por causa do modelo racista brasileiro, muitos afrodescendentes têm dificuldade em se aceitar como negros. Muitas vezes, você encontra uma pessoa com todo o fenótipo africano, mas que se identifica como morena-escura. Os policiais sabem, no entanto, quem é negro. Os zeladores de prédios também.
CC: Quem não assume a descendência negra introjeta o racismo? [...]
KM: Isso tem a ver com o que chamamos de alienação. Por causa da ideologia racista, da inferiorização do negro, há aqueles que alienaram sua personalidade negra e tentam buscar a salvação no branqueamento. Isso não significa que elas sejam racistas, mas que incorporaram a inferioridade e alienaram a sua natureza humana.
CC: O mito da democracia racial, construído por Gilberto Freyre e vários intelectuais da sua época, ainda está impregnado na sociedade brasileira?
KM: O mito já desmoronou, mas no imaginário coletivo a ideia de que nosso problema seja social, de classe socioeconômica, e não da cor da pele, faz com que ainda subsista. Isso é o que eu chamo de “inércia do mito da democracia racial”. Ele continua a ter força, apesar de não existir mais, porque o Brasil oficial também já admitiu ser um país racista. Para o brasileiro é, porém, uma vergonha aceitar o fato de que também somos racistas.
CC: O senhor observa alguma evolução nesse cenário?
KM: Houve grande melhora. O próprio fato de o Brasil oficial se assumir como país racista, claro, com suas peculiaridades, diferente do modelo racista norte-americano e sul-africano, já é um avanço. Quando cheguei aqui há 37 anos, não era fácil encontrar quem acompanhasse esse tema. Hoje, a questão do racismo é debatida na sociedade.
CC: O sistema de cotas deve ser combinado com a renda familiar?
KM: Sempre defendi as cotas na universidade tomando como ponto de partida os estudantes provenientes da escola pública, mas com uma cota definida para os afrodescendentes e outra para os brancos, ou seja, separadas. Por que proponho que sejam separadas? Porque o abismo entre negros e brancos é muito grande. Entre os brasileiros com diploma universitário, o porcentual de negros varia entre 2% e 3%. As políticas universalistas não são capazes de diminuir esse abismo. [...] 
CC: A escola brasileira está preparada combater o racismo?
KM: As leis 10.639 e 11.645 tornam obrigatório o ensino da cultura, da história, do negro e dos povos indígenas na sociedade brasileira. É o que chamamos de educação multicultural. As leis existem, mas há dificuldades para que funcionem. Primeiro é preciso formar os educadores, porque eles receberam uma educação eurocêntrica. A África e os povos indígenas eram deixados de lado. A história do negro no Brasil não terminou com a abolição dos escravos. Não é apenas de sofrimento, mas de contribuição para a sociedade.




5 comentários:

  1. O argumento que a cota é uma ferramenta de inclusão socioeconômica, mas que ainda temos um resgate da raça negra é matador!

    Em 100 anos mudou muito pouco...

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  2. Auuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu...Um dia chegaremos lá...Lá onde? Lá onde a cor da pele não será motivo de preconceito! Mas as cotas tem que contemplar os Negros,e os pobres oriundos das escolas públicas...
    Não gosto do termo afrodescendente,isso é cair na armadilha do politicamente correto.

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  3. somos três matrizes: a lusa, a tupi e a afro. nossa história começa com as três

    em planetas diferentes, mas no mesmo território. sangue vidro e corte


    mas o prof. munanga tem razão: ainda não temos coragem de incorporar em nossa cultura

    a contribuição negra (também tupi). são culturas marginais.

    a educação pode mostrar que todos somos africanos, em se tratando de australopythecus,

    mas dificilmente deixaremos de ser eurocêntricos, porque a própria noção desta educação que aí está é eurocêntrica.

    caímos em mário de andrade: a origem do brasil em macuníma, que tem em seu território,

    aspectos que não são de sua cultura. mas o que é macunaíma, então?


    a tropocália passou por esse mesmo problema, usar guitarra não era correto, pois era

    um instrumento estrangeiro. o violão, sim, era politicamente correto, mas é de origem

    árabe, aí beleza, sinônimo de MPB. treco de louco, a nossa identidade, ou que somos..








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  4. Ah, o mautner diz que somos belos porque somos amálgama, somos mistura, o DNA está aí para provar que mesmo em várias gerações somos descendentes da eva original.

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