O desenvolvimento da psique humana sempre esteve associado ao que o cérebro pensa a respeito do bosque. O que ele vier a ser em nossas pobres mentes, revelar-se-á quem somos nós. Thoreau dizia que se sentássemos para
admirá-lo em sua beleza, chamar-nos-iam de vagabundos. Mas se
cortássemos suas árvores para alimentar uma patética indústria de consumo,
seríamos empreendedores.
Os hippies, quando mergulhados
numa nuvem de THC, - fase pela qual passou a sociedade -, levaram ‘o cérebro social’
a recusar a civilização. Cultuaram e/ou absorveram o mundo selvagem, os
aspectos silvícolas pelos quais a humanidade passara em seus primórdios. Como
se num passado de árvores intocadas, em meio a regatos de água limpa, em meio a
homens e mulheres que expunham seus corpos ao sol e os cobrissem de pele selvagem,
à noite, para fugir do frio, houvesse o único sentido da vida; pelo menos para
aquela vibração cerebral hippie.
É fato que, foi nesse mundo
primitivo, perto do fogo, rodeado pela densa noite em escuridão, às vezes
salpicada de estrelas, ou noutras com a deusa mãe-lua-metamorfose brilhante,
inebriante, misteriosa, delirante, que a humanidade iniciou o ato de divagar,
o ponto de partida do pensamento dos ‘fantasmas’. Vislumbrando o passado, o
futuro, o presente, os deuses, as ervas com suas viagens e os animais com seus
mistérios, que a humanidade iniciou sua ‘viagem’ nesse imenso universo sem
fronteiras, que é 'simplesmente' aquilo que somos no interior de nossas mentes.
Todos os meus delírios, sonhos e
aspirações, foram fundidos num único átimo e moldaram em minha cabeça um elmo
invisível; a barbicha é facilmente observável. Vou com meu cavalo, Pasmaceira,
deserto afora, que é a antítese do bosque, um território devotado à imensidão que passa por dentro do peito e me projeta numa solidão silenciosa,
incapaz de praticar mal algum, ou de qualquer caridade. Pasmaceira é velho,
tenho, às vezes, que caminhar e puxá-lo pelas rédeas e então posso olhar o céu de estrelas. Penso no nome de
minha Dulcinéia del Toboso e de
imediato uma estrela cruza o céu. Sincronia com os átomos do universo. Como um
Rei Mago devo segui-la como quem busca pela simplicidade de um sorriso, ou de uma
palavra no sabor de menta, nascida assim, como nascem os deuses, em meio aos
gestos das mãos e sonhos descritos pra vida.
Passado o deserto, me deparo com
o bosque. Paro e faço uma reverência. Não se pode entrar assim, sem castimonia
alguma. Então me banho de vinho e me abasteço de cachimônia. Meus antepassados
gregos descobriram as traquinagens dos deuses porque bebiam o vinho, bebida
advinda da fruta mais adúltera da terra, pendurada em cachos, oferecida a quem
lhe quiser lamber por inteira nos beiços, esmagá-la com a língua no céu da boca.
No sangue humano o vinho convida o cérebro a dar voos altos, Ícaro etílico, e lhe
empresta os olhos perspicazes das águias das montanhas e vejo então os deuses
num cenário de ilusões concretas, onde nos guiam, nos amam e nos odeiam. Pensar
a si mesmo é o primeiro passo para se libertar dos deuses, da história, do
mundo. Eis a mágica do vinho, do fogo, das paixões.