domingo, 19 de abril de 2015

A lua, o sereno e o pinho

Prefiro o corpo da mulher nua a qualquer ideologia, religião ou arte. Prefiro o ócio à labuta. Desejo a inércia enquanto o planeta descreve sua trajetória na busca pela catástrofe. Dedicar-me-ei ao nada para mostrar meu parco amor a ti, oh! Gaia, que agora és a dona de minha não ação, enfim.
Penso mais nas árvores do que em Deus. Quantas não foram sacrificadas, transformadas em papel para que se escrevesse, numa ode à banalidade, que era preciso amar ao ser perfeito sobre todas as coisas e muito pouco a natureza (?). Que tamanha vaidade é essa que deseja palavras de veneração, bajulação, enaltecimento impressas em papel por seres tão insignificantes, vulgares e descartáveis como nós?
Desejo a sombra solitária, o canto do regato, o azul sereno das montanhas distantes. Amo a terra forjada pela explosão dos vários fogos em suas entranhas e também o sol, esse deus impiedoso e democrático que jorra luz aos quatro cantos e me aquece os ossos, amadurece a uva, fermenta o vinho  − a morada dos deuses − e ainda é o astro que dá sentido à cerveja gelada, ao banho de rio, à nudez dos corpos.
Quero esculpir silêncios. Antídotos às mazelas exaladas pelas bocas da mediocridade teológico-capitalista-digital. Sonho uma poesia visceral que ilumine os recantos do espírito humano e que o bolor, no qual se prolifera o fascismo que reduz a condição humana ao rastejar das quatro patas, pulverize-se nas centelhas dos bosques, onde as ninfas servem o vinho santo aos ateus e aos ‘atoas’, seres mergulhados nos acordes lunares de Debussy.
Que os homens silenciem dentro das canções, não há mais o que dizer. Chega de lamúria, preciso de um acorde que me faça viver a doce manhã que toquei com as pontas dos dedos, quando o vendaval racional cessou por alguns segundos, ou se esqueceu de mim, não sei. Ofereço meu violão em sacrifício pela lua e que assim, como a um sacerdote pagão que persegue a uma dádiva, a mim seja permitido sentir os lábios da maça fresca e despudorada mais uma vez. Depois vagarei pelo deserto, como se fosse eu o beduíno que busca o solo mais sagrado para se deitar e morrer ao lado do amor que escolheu. 


       

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