domingo, 27 de setembro de 2015

Democracia


Me foi pedido, por um dos leitores de minhas crônicas, que eu escrevesse sobre a Democracia, ‘um desejo tão fácil de se ter e um presente difícil de ganhar’, como já disse a sensacional dupla da MPB, Sá & Guarabira, em uma de suas canções, Harmonia.
Deveras, se Democracia quer dizer ‘poder que emana do povo’, e vem pela escolha da maioria sobre quais serão os caminhos futuros, nada melhor do que uma eleição para se esclarecer quem deverá conduzir o Governo do Estado e a administração de interesses conflituosos dentro de uma sociedade ‘constitucionalizada’. − Governo esse que deverá deixar transparecer, ao máximo, os desejos e aspirações populares que o levaram ao poder.
Mas não é só isso, tem mais ‘angu debaixo desse caroço’.  Democracia não se limita só ao resultado da escolha de um pleito, ela é o sistema imunológico do corpo social que impede o desenvolvimento de patologias como a tirania, a ditadura e a proliferação de oligarquias. – Essas patologias são latentes nesse nosso corpo social e num mero cochilo da racionalidade, retornam ao poder e chicoteiam até mesmo aqueles que, de maneira extremamente irracional e ignorante, clamaram por elas.
Claro que, em tempos modernos, a legalidade e durabilidade de um poder eleito para o Governo é cada vez mais frágil. A opinião pública livre, a análise crítica de quem apoia, ou se coloca na oposição do discurso e dos programas eleitos são a essência do dissenso e a maior prova da diluição do poder centralizado. É esse dissenso, que por vezes nos remete à sensação do evento bíblico da Torre de Babel, quem impede a barbárie ‘do olho por olho e dente por dente’ e da História tutelada pelo déspota que escravizava seres humanos e monopolizava a riqueza, como era na Antiguidade. – Foi contra isso que a Democracia, nascida em Atenas, no século V a.c., na Grécia Antiga, se rebelou. Péricles, símbolo da Democracia ateniense, quando escolhido líder, distribuiu terras, fortaleceu a plebe e reduziu o poder da elite.
Benjamim Franklin, um dos pais da nação norte-americana, dizia que a árvore da Democracia, (da liberdade), vez ou outra, deveria ser banhada pelo sangue dos tiranos em combate com os homens livres, para que ninguém se esquecesse do quão importante é esse ‘frágil poder’ em que se tem o direito de escolher o próprio Governo, numa sociedade onde cada indivíduo é igual a um voto.  
Por isso o atentado golpista capitaneado, em nosso país, por Aécio Neves, junto a uma leva de oposicionistas no Congresso, no Judiciário e na mídia tem uma atmosfera abjeta e enganosa. Já de cara, misturar a operação Lava a Jato com um eventual processo de impeachment é pura canalhice. Primeiro, porque Aécio e sua turma estão muito mais ligados às empresas investigadas e suspeitas de pagamento de propina do que Dilma Rousseff. Segundo, porque não há nada que comprove um crime cometido pela presidente da República no transcorrer de seu mandato. Terceiro, num eventual impeachment, o governo cairia nas mãos de Eduardo Cunha, citado diretamente por ter recebido propinas das empresas investigadas da Lava a Jato e mais de uma vez; já há um pedido no STF para abertura de processo contra ele.
Porém cabe uma análise quanto à volatilidade da opinião pública sobre o governo Dilma. Não cabe como argumento para o impeachment os baixos índices de popularidade, isso talvez seja reflexo de um novo comportamento antropológico que parte de dentro das redes sociais, onde se percebe uma reprodução de ideias estapafúrdias que anseiam tornarem-se ‘verdades’ o mais rápido possível, pois afinal, ‘há uma eterna conspiração comunista do PT nos poros do mundo’. – Não sei como não acusaram o PT de ser o responsável pela estética gay do show do Queen, no Rock in Rio 2015, pois o PT, como dizem os conservadores, quer destruir a sagrada família brasileira.
Ainda sobre essa volatilidade de opinião, pode-se aventar que seja fruto de uma classe média mimada que, em função de resultados imediatos, deseja a troca da presidente da República tal como se faz com os técnicos dos times de futebol; ou como ocorre em escolas particulares que dispensam professores com base num ibope produzido pela opinião irresponsável de alunos menores de idade; ou simplesmente porque reproduzir ideias é um sinal de inteligência. Não é assim que se troca de Governo, mas sim com um bom debate racional em períodos eleitorais, embasado na história recente e em seus resultados materiais.
Nossa classe média quer viver num país imaginário, onde o sistema econômico é igual ao de Nova York, mas o Estado, por obrigação, deve praticar ações socialistas na saúde e na educação, ao mesmo tempo em que reduz impostos, e em termos de segurança pública, venha a executar, com bastante ostentação, um código penal característico de países como o Zimbábue, Congo e Afeganistão. E o líder, o tirano que representa essa aberração política, é Aécio Neves, um santo que aspira ser conduzido ao poder por um coro de anjos à base de alcaloides, e tudo para glória maior da TFP. Sim, parece a cena de um filme de Glauber Rocha, o que torna mais do que evidente que nossa classe média sofre, no momento, de um deliro fascista. 
Qual o remédio? Democracia Constitucional!

sábado, 19 de setembro de 2015

Happy Birthday - 3º promo da banda MIssissippi Drake Blues


Road for nowhere 

"Pô, quase todas as músicas tem on the road na letra! 
Parece uma estrada pra lugar nenhum!"

Dida Bruce, guitarrista do Mississippi Drake Blues,
que, dessa forma, batizou nosso disco que sai em breve. 

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

O êxodo macabro dos refugiados


A primeira coisa que qualquer um quer saber em relação aos refugiados sírios, afegãos e líbios são os motivos pelos quais decidiram emigrar de seus países, em busca de novas oportunidades no território europeu. Claro, a impossibilidade de manter uma vida digna nos próprios territórios é a resposta mais óbvia.  Mas de quem é culpa dessa ‘impossibilidade’ sociopolítica (e econômica) que causa privações em milhões de pessoas? Claro, as disputas políticas internas e a exploração econômica predatória por parte de empresas do Ocidente.
Detalhando: na Síria há uma guerra pelo controle político entre grupos os jihadistas e os grupos curdos. Esse conflito ocorre há quatro anos e vem despedaçando o país. Além disso, o petróleo sírio, hoje explorado por empresas russas, foi barrado pela União Europeia em seu território, o que causou uma grave crise econômica na Síria.
O projeto dos EUA-Europa era derrubar o ditador sírio Basshar al-Asaad, que usou força extrema contra o movimento político chamado de Primavera Árabe. Esses tais protestos ‘primaveris’ trariam, em tese, transformações políticas que facilitariam a entrada de empresas ocidentais nos países do oriente. Fácil, dessa forma, entender a responsabilidade da Europa, a mando dos EUA, ao dar apoio aos curdos para estimular a guerra civil síria, além de criar um embargo para os produtos sírios, ao mesmo tempo em que apoiava, via mídia, a Primavera Árabe. Ações geoplíticas nos bastidores e no palco midiático.    
A Líbia, depois que o ditador Muammar Khadaf foi deposto, em 2011, mantém-se dividida em duas áreas políticas e com dois governos paralelos em conflito constante. Os poços de petróleo são explorados por empresas ocidentais, mas a insegurança política obrigou a paralisação da produção. A derrubada do ditador Khadaf, pela Primavera Árabe, mostrou-se um verdadeiro desastre, inclusive para a própria Europa, grande consumidora do petróleo líbio.
Há momentos em que os grandes jogadores de xadrez erram feio na dose da jogada no tabuleiro da geopolítica. Queriam tirar o ‘atravessador’ de petróleo, Khadaf, com a Primavera Árabe, mas como as coisas saíram do controle, o que resta agora é levar o país à maior deterioração possível, para que a necessidade de exportar petróleo a preço de banana seja a única saída do povo líbio. No longo prazo, o Tio Sam e a Europa fizeram uma bela jogada. – Claro, os refugiados não faziam parte do plano.   
No Afeganistão, um dos países por onde passa o gasoduto que vai do Mar Cáspio à Índia, hoje governado por um grupo que recebe apoio dos EUA, outrora dominado pelos Talibãs de Bin Laden, ocorre uma crise econômica sem precedentes. A base de sua economia é a venda da papoula, uma flor que é usada na fabricação da morfina e da heroína. – O choque de capitalismo prometido pelos EUA, depois da deposição do Talibã, não veio.
Deveras, a dança macabra dos refugiados é só uma reação à desastrosa política externa do Ocidente e sua eterna necessidade por petróleo barato. A manutenção da qualidade de vida nos territórios europeu e americano é alcançada em função da deterioração da economia dos países exportadores de matéria-prima. – Nunca é demais lembrar que isso pode ocorrer futuramente no Brasil, caso o conservadorismo dos tucanos, da mídia e do coxinato imperem sobre a legislação que viabiliza a Petrobrás e o Pré-sal, pois as privatizações dos mesmos correspondem à diminuição de nossa soberania.  Americanos e europeus desejam evitar que o Brasil industrialize o próprio petróleo.
É preciso entender que em tempos de redes sociais, cultura digital, globalizações, informação just-in-time, liberdade sexual e consumo desenfreado de drogas, a velha receita colonial da exploração das grandes reservas de matéria-prima nos países pobres mantém-se em pé. Só são benvindos, nos EUA e Europa, os recursos naturais desses países carentes, o mesmo não se diz das pessoas, dos corpos que compõem a cultura desses lugares que, em função da crise gerada pelo ocidente, desejam atravessar uma fronteira física e começar uma vida nova. A emigração de pobres para territórios desenvolvidos é quase uma heresia, um crime e não se pode fazê-lo sem encontrar resistência militar e midiática. Trata-se de uma grande injustiça camuflada pelo jornalismo investigativo e ignorada pela ONU.
No Brasil, o coxinato propaga posts criticando a truculência dos europeus contra os refugiados, mas em contrapartida, quando o assunto nos diz respeito, expulsam, todos os dias, em frases de ódio e pronunciamentos xenófobos, os haitianos, os nordestinos, os negros, os índios e etc., etc..