Uma
parte significativa do mundo acadêmico deseja a 'morte' de Marx o mais rápido
possível. Digo sua morte filosófica; não veem a hora de poder enterrá-lo no
mundo do esquecimento, na Terra do Nunca, junto com Peter Pan. Mas é fato que o
bom e o velho Marx desenvolveu uma crítica interessante sobre o capitalismo.
Seu segredo? Foi ter lido Balzac. Isso é um segredo, por favor, você que é anti-marxista, não conte esse segredo ao mundo: foi Balzac quem mais ensinou Marx
sobre comportamento da burguesia do que os economistas da época.
Bem,
o que quero dizer é que Marx desenvolveu o conceito do economicismo para melhor
interpretar o comportamento antropológico dos indivíduos nas sociedades que
apostaram seu desenvolvimento no livre mercado. Ou seja, dentre os vários aspectos que compõem a vida humana,
cultura, religião, política, conhecimento, economia, essa última seria a mais
importante. É o que possibilita nossa real interpretação da condição humana. Confira os dados econômicos de uma sociedade de consumo e se poderá entender se
ela vive bem ou não.
Marx
discordou de um deus da filosofia, Hegel, que dizia que pensamento e realidade
formavam uma só coisa. Hegel, no século XVIII, afirmava, também, que o Império
Prussiano, no qual vivia, era a forma mais avançada de civilização, o ato pleno
da sofisticação e do progresso. Ou seja, no Império Prussiano a humanidade
estava no seu auge.
Hegel
mantinha-se tranquilo porque acreditava que a consciência histórica dos
indivíduos impediria a repetição dos erros anteriores. E mais, a sofisticação
havia chegado graças ao processo dialético, um eterno atrito de ideias onde haveria
sempre a ideia síntese (a base histórica,
o momento) e a 'ideia' contrária, a antítese (crítica/criatividade/inovação). Tal
processo, que não cessava nunca na mente humana, causava o desenvolvimento da
sociedade. (Os gregos antigos conheciam bem a dialética).
Mas
de onde vinha a dialética? Para Hegel, nascia do pensamento humano, que produzia
tanto pela racionalidade especulativa, quanto pelo empirismo, que era a ação de
aprender com as experiências. Um exemplo prático, no Brasil de 2018, da necessidade da dialética: será que
aprendemos que o preço de nossos combustíveis atrelado ao dólar se tornou
impraticável? Até quando poderemos suportar a isso? Qual antítese para tal
fórmula? A tese, ou a síntese da dolarização dos preços dos combustíveis, numa sociedade que recebe seu salário em reais, necessitada de uma antítese, de
uma contradição. É isso que move o processo de desenvolvimento. (E antes tarde do que nunca).
Claro
que o processo dialético é uma lâmina cega, que tanto pode ir adiante, em
termos civilizatórios, quanto retornar pras trevas do pensamento humano. Um
código penal pode evoluir em direção a uma racionalidade moderna e eficaz, ou
retroagir em direção ao código de Hamurabi, um código que já cumpriu seu papel,
sua síntese. Retornar a ele seria um retrocesso.
Mas
e Marx, como embarcou nesse processo dialético indicado por Hegel? Marx entendia
que tal processo se dava em função das necessidades biológicas e materiais dos
indivíduos. Que a mente humana e a consciência se construíam em função de como
as sociedades venciam seus obstáculos. Saciar a fome, vencer o frio, dominar os
animais, criar deuses, desenvolver agricultura, criar o Estado e manter a ordem
era um conjunto de conceitos que se processava de forma dialética na mente dos indivíduos,
e isso de forma integral; numa analogia, um conjunto de aplicativos, porque o sistema
operacional, a nave mãe do processo do desenvolvimento humano era (ou é) a
economia e sua dinâmica.
O
pensamento crítico de Marx supervalorizou a economia e seus efeitos sobre
entendimento da sociedade sobre si mesma. Assim, convencionou-se chamar tal conceito de 'economicismo'. Por isso, tal como Noam Chomsky, creio que os debates políticos
modernos se dividem entre marxistas de direta e marxistas de esquerda. Chomsky
até brinca e diz que Trump é um marxista de direita. Como?
É
simples: marxistas de direita: são aqueles que acreditam que a sociedade vai
usufruir melhor da economia se ela for projetada e idealizada para favorecer o
acúmulo de renda gerado pela concorrência. Esse acúmulo de capital em poucas
mãos, um dia será re-investido e a circulação do dinheiro continuaria a criar
uma demanda por empregos e com isso a sociedade se manteria em níveis regulares
de qualidade de vida. Deus salve a América! This is american way life. Diga-se de passagem, o que
corrompeu tal mundo foi a especulação em excesso, que desconectou a economia
real da economia virtual especulativa financeira.
Do
outro lado estão os marxistas de esquerda: são aqueles que acreditam que a economia
deve receber estímulos e controle parcial do Estado para que a circulação do
dinheiro nunca cesse, e sua continua demanda mantenha empregos e concorrências
num mercado livre, em convivência pacífica com programas sociais. E ainda: por
vezes, tal mercado deve ser subsidiado, principalmente em sua matriz
energética.
Mas
as discussões políticas modernas não se limitam ao economicismo. Existem as questões
morais e éticas: sexo, arte, família, religião, educação, comunicação,
liberdade e etc. Entramos assim numa seara até mais complexa. Marx se defendeu
bem dessa armadilha ao dizer que o modo de produção e de consumo determinam a
moral e a ética dominante.
Concordo, pois quem discordaria da forte influência do consumo, e sobretudo do que
se consome, nos valores morais e no comportamento ético? Seria um clichê dizer
que o celular e a internet tornaram a imagem do outro, do próximo a que devo amar com a mim mesmo, segundo cristianismo, algo descartável e
alimento contínuo de escárnio e depreciação, graças a uma tecnologia eficiente
e de fácil acesso mercadológico?
Bem,
pra falar de moral precisamos de Kant, de Immanuel Kant. E de Nietzsche, por
que não? Mas num outro texto. Abraços.
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