“A realidade é
aquilo que ser forma às margens da ficção”. Aprendi isso com Alberto Manguel.
Talvez o homem que mais ame livros nessa vida. Vive das palestras que faz mundo
afora. E todas elas sobre a escrita e as histórias que as rodeiam. Escreveu
vários livros, mas um deles me dá uma inveja boa. Queria poder fazer o mesmo.
“Os Livros e os Dias”, um diário de leituras sobre os livros que o ajudaram na
formação humanista, revisitados por um olhar maduro. Do Deserto dos Tártaros,
de Buzzati, ao Memórias Póstumas de Brás Cubas, do bom e velho Machado,
passando pela Ilha do Tesouro, de Stevenson, — que este cronista pangaré está a
ler — e alguns outros da mesma ‘fina estampa’.
Depois que
‘conheci’ Manguel, a regra entre realidade e ficção tornou-se clara, sim a
‘regra é clara’: a realidade só pode derivar da ficção. É simples. Não gosto de
usar exemplos religiosos, mas vamos lá. Jesus quando contava suas parábolas, —
sem pedir dízimos —, a seus seguidores, usava figuras ficcionais, como no caso
da ‘volta do filho pródigo’. Nenhum daqueles personagens existiu na realidade,
somente na ficção, mas sua ação na mente e nos corações dos homens que a ouviam
era inevitável. Lógica da ficção: transformado o homem, transformada a
realidade que ele passará a construir no espaço geográfico.
Após os textos
religiosos, o Teatro, a Literatura, o Cinema, as Artes Plásticas, todos ajudaram
na formação da humanidade construtora de realidades em concreto, aço e
especulação. A posse da realidade está nas mãos daqueles que são capazes de
teorizar sobre ela e desencadear ecos sobre o senso comum. Quanto não devemos a
Chico Buarque pelo seu, “Pai! Afasta de mim esse cala-se”? Ou a Chaplin, em seu
clássico, Tempos Modernos, o entendimento de nossa tragédia da perda definitiva
do tempo, somado à asfixia do trabalho alienado? Quantas ‘legislações’ não foram promulgadas
com a influência do ‘estado de espírito’ gerado pela ‘ficção’, pelos anseios da
Arte? Percebeu, caro leitor: morta a arte, morta a humanidade?!
E como a Arte
morre? Quando a mediocridade emerge e vai muito além da linha da cintura e
sufoca os indivíduos que não percebem o chafurdar no mediano. Milhões de
pessoas ‘escrevendo’ em facebooks, twitter e blogs da vida, mas incapazes de uma
frase, uma imagem apenas que possa canalizar os anseios da humanidade.
E além da
avalanche de mediocridade, o casamento da política com o capitalismo,
apadrinhado pela mídia, tornou-se a nova central de confecção de teorias da
realidade. Vem dali o manual ético-moral com suas ‘modernizantes visões’ em
planilhas e conceitos ‘otimizadores’ de gestões públicas e privadas; enquanto
isso, somos ‘livres’ nas redes sociais ao postarmos que a tarde foi chata,
porque havia uma consulta no dentista e nessa hora, não se pode ‘ver’ no
celular o que compartilharam de ‘essencial’ em nosso perfil.
Se Jesus
voltasse nos dias de hoje, — não acredito que volte, porque às vezes penso que
nem veio, pois como ficção que foi, desencadeou maravilhas e tragédias —,
mudaria o título de sua parábola da “Volta do Filho Pródigo” para o “Retorno do
Filho Medíocre”. Depois de perambular pelas redes sociais, o filho se depara
com uma biblioteca e ‘recomeça’ a ler os clássicos e, como conseqüência,
resolve mudar o mundo. O primeiro passo é na remoção de políticos do DEM, do
PSDB, do PT, do PMDB, do PSB, da Rede Sustentabilidade e derivados, das mãos da
iniciativa privada, berço das teorias das ‘realidades’ planificas, estéreis e
‘precárias’.
A política deve ser
pública. Pense nisso! É preciso acabar com o ‘totalitarismo’ da ideia privada e
libertar a Arte do calabouço da mediocridade.