quarta-feira, 19 de março de 2014

O sentido da vida


Os elefantes partem para seu cemitério quando sentem que a vida chegou ao fim. E o que fizeram de bom para que ela possa ter algum significado? Inevitável, somente os elefantes podem responder a essa pergunta, nem sei o porquê de fazê-la. É que fiquei intrigado: ao terminarmos com o tempo que nos foi permitido, o quê devemos saber sobre a vida, o que devemos levar em nossas mentes ao além-desconhecido?
Qual a importância das equações de 1º grau para quem está prestes a bater as botas? Ou mesmo as precisas citações do Código Civil? Ou a escalação do Corinthians, ‘o desclassificado’, do último campeonato paulista?  Ou até mesmo saber qual a importância de Duque Caxias para o exército brasileiro? E quem saberia me explicar qual o significado das reuniões administrativas que partem de lugar algum para alcançar o nada? Ou mesmo da ideia de se saber que há ETs por toda a parte, vislumbre perene de lunáticos?
Acredito que Moisés escondeu o décimo primeiro mandamento, que dizia o seguinte: “Prepararás a caipirinha perfeita: gelo, limão, cachaça e açúcar, os quatros sagrados elementos em equilíbrio, para glória maior de seu irmão-marido, que haverá de bebê-la”.  Minha esposa é herdeira dos segredos judaicos da cabala e sabe preparar a caipirinha perfeita.
Acho que é esse tipo de tecnologia que devemos levar conosco pras cidades flutuando no espaço, ao redor da Terra, como dizem os Kardecistas. Aí sim, será um prazer habitá-las, e isso graças ao aumento das chances de se beber uma caipirinha. Conhecimento levado da Terra para os homens santos do espaço.
Entenderam agora a importância de se saber preparar uma bela bebida? Isso pode mudar a qualidade de vida do além. Samba, suor e caipirinha. Não quero adentrar na seara dos petiscos, mas uma caipira, à mercê de um filé a palito, pode edificar o paraíso nas papilas degustativas e por vários minutos. Um orgasmo para o paladar.
Se Jesus tivesse um pouco mais de tempo para preparar a última ceia, teria servido caipirinha no lugar do vinho e com o pandeiro nas mãos, entoaria o samba de Adoniram Barbosa, “...não posso ficar, mais nenhum um minuto com você, sinto muito amor, mas não pode ser!”. Judas no cavaco, Maria Madalena no reco-reco e Pedro no bumbo, dariam o toque de paixão de carnaval.
E antes do galo cantar, no momento da sétima caipirinha, Jesus iria se levantar e dizer: “...um de vocês vai me trair!”. E antes mesmo que terminasse a frase, Judas seguiria Maria Madalena até a cozinha, onde os torresmos estariam prestes a mergulhar na gordura quente, e a couve adormecida sobre a pia, em breve abençoada pela música de Chico Buarque a soar no rádio, e a beijaria sem nenhum pudor. E tanto que seria o ardor que a abraçaria como se fosse a última, como se a morte viesse com uma horda de romanos para levar seu mestre e irmão ao flagelo da cruz.
Cristo morreu no sábado, na contramão, atrapalhando o tráfego, sem erguer paredes sólidas de templo algum, sem forças para pedir ao pai que afastasse dele esse ‘cale-se’, que normalmente os homens de negócios impõem aos mortais goela a baixo, todo o dia.
A Judas só coube o exílio, e um eterno autoflagelo ao cantar, todas as noites, nos botecos da vida, o samba canção: “..lábios que beijei!”. E sofrer ‘ad infinitum’ por toda a vida, por ter beijado a mulher de seu irmão, com a idea de que o amava tanto quanto Madalena, e isso o transformou num homem louco, por consequência, num santo.
Violões, caipirinhas, Madalenas, beijos, Judas e Buarques: o que há mais pra se fazer nessa vida?