Gunter
Grass é minha antítese ao escritor judeu e Nobel de literatura, Isaac Bashevis
Singer, e por si só, o outro lado da mesma moeda. Um menino alemão que foi
seduzido pela juventude hitlerista e, durante a 2ª Guerra mundial, se alinhou
aos valores, discursos e ‘sonhos’ arianos; uma criança, que como milhões de
outras, não percebeu a força maligna do Estado nazista trespassando por seu
corpo, sua mente e criando alicerces em suas palavras e em seu coração. Mas ele
sobreviveu ao pesadelo e se tornou um homem livre dessa praga. E tal como Singer,
escolheu a literatura como trabalho e produziu livros belíssimos. Um deles
conta a história do último ser humano que ainda sobrevive num mundo pós-apocalipse-radioativo.
Até certo ponto um enredo normal, não fosse a morada desse Crusoé às avessas, a
‘mente’ de uma Ratazana.
A
tal Ratazana, que também dá título ao livro, conversa com seu amigo humano
exilado em suas lembranças através do pensamento. Por vezes ela o ameaça,
“...diga isso de novo e nunca mais penso em você e assim poderá morrer no
esquecimento”. A triste figura humana,
flutuando na mente da roedora, pede desculpas, pois sabe que não tem
alternativa: pra continuar a viver, precisa aceitar as críticas ácidas desse
animal repugnante, além de ver os fatos armazenados em sua memória como se fosse num cinema tétrico. Várias lembranças aparecem diante de seus olhos, são 'filmes' e mais 'filmes'. Num deles há o último bosque ainda 'vivo' na Alemanha.
Para defendê-lo do fim inexorável, todos os personagens dos contos de fadas
clamam aos povos que os ajudem: "É preciso salvar o bosque!"
Porém o governo alemão se prepara para inaugurar um bosque irreal, a única maneira de enganar o pensamento crítico. Se trata de um bosque de plástico, uma ilusão, um fake para atender aos personagens dos contos de fadas que logo concluem que, viver diante de um bosque de plástico é o mesmo que viver diante de falsos pensamentos. - Assim são revelados os últimos suspiros da Terra nas várias narrativas paralelas que atormentam o último homem e ao leitor também, que está na mesma situação desse sobrevivente terminal: não há mais Terra, só a mente da Ratazana sobre escombros, chorume, ácido e uma revisão histórica sádica e sarcástica.
Porém o governo alemão se prepara para inaugurar um bosque irreal, a única maneira de enganar o pensamento crítico. Se trata de um bosque de plástico, uma ilusão, um fake para atender aos personagens dos contos de fadas que logo concluem que, viver diante de um bosque de plástico é o mesmo que viver diante de falsos pensamentos. - Assim são revelados os últimos suspiros da Terra nas várias narrativas paralelas que atormentam o último homem e ao leitor também, que está na mesma situação desse sobrevivente terminal: não há mais Terra, só a mente da Ratazana sobre escombros, chorume, ácido e uma revisão histórica sádica e sarcástica.
Em
meus devaneios o bosque é habitado por ninfas, as quais a humanidade ama
profundamente. A sedução das árvores, do vento, das sombras nas profundezas me
atraem constantemente. Meu Ego me diz que elas estão brincando comigo, que riem
de mim pelas costas, que criam coisas fantásticas para um homem velho que se
mantém em guarda diante do bosque e não sabe se segue em frente, ou se retorna.
Mas eu não ligo. Os sonhos, o amor são poderes que também pode destruir o que
sou; tal como a morte o fará.
Sabina
Spielrein, paciente de Carl Jung, em 1906, que 'havia ficado louca' porque sentia prazer
com a dor, e logo só poderia ser uma aberração, sabia que o amor liberta porque
destrói. Não me importo em ser feito em pedaços. Morreria mil vezes para sentir,
de novo, o néctar do vinho da juventude das ninfas e depois uma carícia na pele
eternamente jovem dessas belezas mitológicas.
Quanto
mais as amo, mais minha alma flutua e me torno jovem; as impurezas do corpo se
transmutam em estrelas cadentes. Como não amá-las, como não morrer diante de
olhos castanhos tão ambíguos, como não adentrar no bosque e abraçá-las à
revelia da história, do destino? – Digo a meu Ego que quando as amo, nos poros
da tarde, no passar das horas, passo a ser barbaramente o que sou. Desejo
despudoradamente ser ainda mais eu mesmo e sem piedade alguma. Ali está o
bosque, ‘sombrio, atraente e escuro’ e com dúbios olhos castanhos. Às vezes não
percebo que as árvores são metálicas. Carvalhos de bronze, pinheiros de cobre;
mas ao toque dos dedos, sinto que é tudo madeira nobre.
Sabina
morreu na Rússia, assassinada pelos ‘heróis nazistas da infância’ de Gunter
Grass, dentro de uma sinagoga, na 2ª Guerra mundial. A filha estava junto dela.
Em seu diário, encontrado anos depois, pedia que quando a morte a levasse, que fosse cremada e suas cinzas jogadas num bosque e que uma
placa com a inscrição, “Aqui jaz Sabrina Spielrein, alguém que também viveu e
morreu como um ser humano.”, celebrasse sua jornada pela Terra e, finalmente,
seu descanso na escuridão do bosque.