quarta-feira, 25 de maio de 2011

Chico Bento

Os milhares de leitores de Maurício de Souza, autor dos gibis da turma da Mônica, não passaram a falar como Chico Bento porque leram suas histórias. Os leitores de Guimarães Rosa também não passaram a falar como os jagunços do interior do norte de Minas Gerais, quase um dialeto, porque leram o livro Grande Sertões Veredas. Não se pode deixar de estudar as várias maneiras de se falar e de se escrever. Primeiro é preciso lembrar que a finalidade da língua é a manutenção da comunicação entre nós, seres humanos, e não a manutenção de regras rígidas de normas gramaticais.

Em termos filosóficos pode-se questionar: quem inventou a Gramática? Por que devemos seguir normas que não ajudamos a criar? Na realidade, dificilmente, ajudamos a manter leis e regras que não têm significado profundo em relação aos nossos hábitos e perspectivas. Se assim fosse, as mulheres ainda se casariam virgens e todos nós teríamos a mesma religião, ou mesmo time de futebol.

O MEC lançou, recentemente, um livro didático de Português, “Por uma vida melhor”, de Heloísa Ramos, onde se encontra frases como “nós pega o peixe”, “os livro” e mais maneiras de se falar nas ruas e bairros distantes dos grandes centros urbanos e também dos centros acadêmicos. Ocorreu uma enxurrada de críticas, principalmente dos ‘grandes articulistas’ da mídia, preocupados porque agora iríamos passar a falar errado em todo país; esses articulistas são homens e mulheres com formação ‘superiorzíssima’, que em casa, depois do trabalho, com certeza, ouvem a não menos cult, Marisa Monte, com sua belíssima voz a propagar um “beija eu, beija eu”; ou se soltam em festas de confraternizações, depois de alguns goles de uísque, e cantam e dançam canções de Adoniram Barbosa e ainda berram, “ ...o Ernesto nos convidou, pro samba ele mora no Brás, nos fumo...” e segue lista.

Não podemos nos esquecer que a própria Escola é um livro didático. Quando se organiza as famosas Festas Juninas, e gritamos no pátio, “óia a cobra!! É mentira” “Ô trem bão, sô!”, nos ensaios e apresentações de quadrilhas, nem nos preocupamos se depois da festa as crianças vão passar a falar assim. Por que será? Será que é porque fica claro que é uma maneira de se falar num espaço que, culturalmente, entendemos como rural, caipira, etc.? Ou seja, que tem sua riqueza de expressão própria e que de certa forma, convivemos com ela e até fazemos festas em sua homenagem (?)

Percebo o cheiro do preconceito sobre o fato. Mas ao mesmo tempo a polêmica é salutar. Ela nos remete a um velho debate sobre a ideologia, implícita ou explícita, nos textos didáticos; ou em qualquer outra forma de expressão escrita. Ou seja: é o sujeito que é formado pelo texto, ou é o sujeito quem forma o texto?

O fato é que devemos nos manter calmos, não vamos abraçar uma crise de nervos e nem mesmo nos apavorar “com aquilo que ainda não é mesmo velho”, como diria Caetano Veloso e outros fãs mais ardorosos do músico baiano. Sigamos banhados pela luminosidade do compositor Valter Franco e seu mantra (oração) mais belo: “o importante é ter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranqüilo”.

No mais, é ler. De Shakespeare a Bukowski; de Celine a Pessoa; de Sartre a Vinícius de Morais; do Eclesiastes a Marquês de Sade; ad infinitum...

domingo, 22 de maio de 2011

Por que a maconha é proibida e nem se pode discutir o assunto?


Pô, mas nem discutir o assunto?


a polícia parte para cima dos manifestantes pró-maconha. deveria fazer isso sobre as fábricas de armas. estamos num país onde se é possível comprar uma arma legalmente, um objeto cujo a finalidade é exterminar outro ser humano. porém, fumar um cigarro numa praia ensolarada, ao sol de bob marley, é proibido. o pior é não poder nem colocar o assunto em debate. a foto acima é na avenida paulista, nos andares superiores do sistema financeiro e suas filiais, cheira-se cocaína aos rodos, o alcalóide ajuda na velocidade dos negócios. já o tetra-hidro-canabinol é lento demais, contemplativo, anti-produtivo. que coisa! será esse o motivo de tanta proibição. veja filme abaixo.


pagamos impostos que mantém a força de 'choque' que violenta nossa própria forma de pensar. tenho em conta que a civilização e a democracia passam por outros caminhos. enquanto isso a bomba atômica, os revólveres, a homofobia, a corrupção andam livres no nosso mundo proto-fascista-capitalista, que por por ironia, quer denominar-se 'neo-liberal'.

sábado, 21 de maio de 2011

Amor Fati?

Claude Lévi-Strauss


Manus cracks eucalipithuns

O homem já foi australopitecus, cro-magnon, neanderthal, sapiens e hoje está desembocando no manus-cracks-eucalipithuns. Detalhe: a meu ver, involução. Característica da vestimenta: camisa estampada ou com desenhos incompreensíveis, bermuda colorida, obrigatoriamente em choque com a camisa, — não podem combinar —, corrente grossa sobre a camisa, celular proliferando ruídos atordoantes nas mãos e um dialeto que se assemelha ao barulho de uma máquina de lavar com defeito na correia. Terra de origem: EUA, MTV. Também se dirige às mulheres como se as mesmas fossem do sexo masculino, chamam-lhes de "cara".

Foi num dia de semana, quarta-feira, dia internacional da faxina, que me deparei pela primeira vez com um indivíduo dessa espécie. Eu estava no jardim — nesse dia a casa é toda da faxineira — e deixei o aparelho de som ligado, enquanto molhava as plantas. Ele olhou através da grade de minha casa, arrastava uma menina pelas mãos, e disse:

— Ei! í ki tá rolando í?

Claro, eu não entendi. Parecia liquidificador sem tampa produzindo onomatopéias.

— Não entendi! — Respondi.

— Ê, pô! ki tá rolando ííí?

Continuei na mesma e fui salvo pela menina, ainda com resquícios sapiens:

— Ele que saber que barulho é esse, na sua casa?

— Hã!? É música! Mais precisamente, Chico Buarque.

Ele estranhou eu ter nomeado a música como música. Sacudiu a cabeça negativamente e disse, apontado pro seu celular:

— Ó! Ó! F'ancadão! — Ele aumentou para eu ouvir. Ouvi uma voz horrível berrando palavras que eu nunca imaginei que apareceriam numa música: “EU VÔ COME MELECA! EU VÔ COME MELECA! VEM CACHORRUDA! VEM CACHORRUDA! iiia! iiia! iiia! Brarrrrrrrrrrrr! Tum! Tum! Tum!”

Já ouvi músicas melhores provinda de motores prestes a fundir. Batedeiras também soam melhor do que aquilo. Pra meu alívio ele desligou logo, e deu um sorriso vitorioso, querendo dizer, “ouviu, isso sim é música”.

Nesse instante começou outra música de Chico Buarque, ‘Caros Amigos’, Francis Hime esmerilha o piano, tem uma flauta, os instrumentos de percussão soam alto e a voz do Chico vem tecendo versos tais como, "...sem uma cachaça, ninguém segura esse rojão".

Claramente a harmonia batia-lhe nos ouvidos e caia no chão, pérolas não entram em ouvidos trucidados pelas ‘desarmonias modernas’ e pelas imagens vazias da MTV; nem era preciso ser músico para compor um funkadão. Democracia musical? Dionísio com cera nos ouvidos? Efeito do crack nessa geração? Quem saberá?

O fato é que este novo hominídeo usa sempre o mesmo traje, o que faz toda sua espécie parecer com uma plantação de eucaliptos: estranha, insípida, utilizada para fabricação de papéis de ofícios, e banalmente homogênea.

Claude Levi-Strauss tinha razão, quando disse que havia se tornado num Anarquista de direita. Naquele dia eu entendi isso.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Elite de Higienópolis-SP não quer gente diferenciada em seu bairro; por isso não quer metrô



Sugestão do amigo Anderson Quirino



Lula comentou o caso:

Na saída da homenagem que recebeu no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, o ex-presidente Lula comentou sobre o comportamento dos moradores do bairro de classe alta Higienópolis, na capital paulista, ao pressionarem para “expulsar” uma estação de metrô no bairro.

– Eu acho um absurdo porque isso demonstra um preconceito enorme contra o povo que anda de transporte coletivo nesse país…

… Eu sinceramente não posso conceber que uma pessoa que estudou tanto e tem posses seja tão preconceituosa de querer evitar que as pessoas mais humildes possam transitar onde moram.

Um dos ilustres moradores do bairro elitista é o ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso.


o interessante no caso foi a reação da blogosfera que desencadeou protestos bem humorados, mas não menos importantes. a velha metáfora de Gilberto Freire, velha mas atual, deixou claro que o pessoal que ainda se enxerga dentro da Casa Grande, não aceita a existência, a ascendência social e mobilidade urbana do povo da senzala, hoje na periferia. por isso esse blog se solidariza e parabeniza aqueles que levantaram sua voz contra essa postura obscena e retrógrada da elite de higienópolis.


PS: depois da pressão, o não menos elitista, geraldo alckmin, deu ordens para que a estação saia de qualquer jeito; ficou mal pra caramba, o comportamento de seus eleitores de higienópolis, curral eleitoral dos tucanos.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Ironias obscenas

Inflação: A Globo quer o retorno da inflação a qualquer custo. Para atingir o Governo Dilma e baixar sua popularidade, faz de tudo, até joga a favor dos especuladores. O problema é que o etanol ‘se recusou’ a manter-se nas alturas e está caindo, aliás, como ocorre todo ano.

Copa de 2014: Deu a louca na mídia. Estão preocupados com que os estrangeiros irão dizer dos nossos aeroportos, como se os aeroportos do mundo não tivessem filas e problemas de embarque e desembarque.

Aécio 2014: a Globo e o DEM lançaram Aécio Neves como candidato à presidência da república para 2014. Pena que esqueceram de avisá-lo, assim ele não teria se recusado a fazer o teste do bafômetro, quando parado num comando da polícia no Rio de Janeiro. Detalhe: o carro não estava no nome dele e ainda tem uma penca de multas por excesso de velocidade. Eu já vi esse filme: só que o protagonista era Fernando Collor de Mello, também lançado pela Globo e pelo PFL, em 1987. PFL é o antigo nome do DEM.

Professores do Estado de São Paulo: ano passado votaram em massa em Geraldo Alckmin, em função do Bônus salarial que foi alto. O fato de ser um ano eleitoral foi mera coincidência. Já o Bônus salarial de 2010 ficou, para muitos, na casa dos centavos. Fiquem tranqüilos, em 2014, vocês, caros educadores, votem nele de novo.

Transporte coletivo na cidade de São Paulo: A Globo descobriu que o metrô de São Paulo foi um dos que menos cresceu, em expansão de linhas. A Globo só não conseguiu, ainda, associar a má administração contínua do estado de SP ao grupo que o governa há mais de 16 anos.

TSF: enfim, uma dentro: as relações homo-afetivas ganharam o mesmo direito das uniões estáveis heterossexuais. Mas o habeas-corpus concedido pelo Ministro Gilmar Mendes, ao banqueiro Daniel Dantas, por telefone, em 2009, até hoje não foi possível de ser engolido. E se você, leitor, estiver numa enrascada, ligue para Gilmar Mendes no STF e peça habeas corpus por telefone; se o crime for do colarinho branco, maiores suas chances de deixar o delegado que lhe prendeu falando sozinho. Protógenes que o diga.

Fukushima: só agora o Governo japonês entendeu que, em áreas de terremoto, não se deve construir usinas nucleares.

José Serra: não fala mais sobre aborto. Será que era só pra ganhar votos daqueles que não sabem separar a religião da política?

Ronaldo Gaúcho: eu e milhões de rubro-negros, por esse mundão afora, esperamos ansiosos por sua estréia no Flamengo. Será no campeonato brasileiro?

Murici Ramalho: poço de lucidez, em se tratando de futebol. Parece que ele foi o único que entendeu que o número 9 do Santos, o tal Zé Love, mais atrapalha Neimar e Ganso do que completa o ataque. Aquele segundo tempo contra o São Paulo, humm, foi demais.

Enquanto isso, Kadafi não larga o osso e uma nova dupla caipira será lançada no Faustão: Obama e Osama.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

************************************* jimy god

dica lupina, hendrix chora o guatambú e soa mais moderno que a pós-modernidade.

mas quem se importa com a pós-modernidade e sua música chinfrim?


quarta-feira, 4 de maio de 2011

A condição humana

O despertador toca pela manhã. Acordamos. Uns dão graças a Deus porque têm um lugar para ir trabalhar. No caminho, às vezes, pensamos em por que fazemos isso. Depois vem a lembrança, a casa está cheia de móveis e eletroeletrônicos. Uns mais velhos e outros novos. Alguns pagos e outros a pagar. Sempre é um colega de trabalho, ou marketing da TV, que me indicam que é preciso atualizar-me, comprar novos objetos maravilhosos e me integrar cada vez mais. Mas me pergunto: Me integrar ao quê?

Volto pra casa e lá estão os bens adquiridos. Sempre pensei que eu fosse o dono deles, mas eis que uma luz me iluminou numa melancólica tarde cinzenta, o sino da igreja anunciava a Ave Maria, eu era a posse dos objetos. Eu trabalhava pra eles. Eles possuíam minha força de trabalho, meu suor, meu desgaste. Eu, um objeto dos objetos de consumo. Minha servidão foi constatada com o número de carnês que estavam sobre a estante, que me dizia que precisava ser trocada por outra mais clara, ou mais escura, ou de outro material qualquer.

Olhei bem pra ela, encarei com certa indignação. Eu queria minha carta de alforria e ela ali, querendo ser trocada:

— Já é hora, homem! Já não me cabem coisas. Compre outra!

— Que coisas?

— Ora, papéis, lembranças, bugigangas, etc.

Deixei-a falando sozinha. Sentei-me no sofá e liguei a TV. Na tela apareceram dois olhos gigantes. Tomei um susto, troquei o canal, mas os olhos continuaram se fixando em mim.

— Olá, você não acha que já esta na hora de me trocar?

Fiquei atônito por alguns momentos. Ela estava falando diretamente comigo.

— Ei, você é surdo? Já é hora de me trocar! — Não pude evitar e tive que responder:

— Trocar você? Por quê?

— Ora, estou fora de moda, muito larga, as telas de hoje são finas.

Desliguei e fui para o quintal, ficar sob a árvore. Aproveitei e liguei meu aparelho de vinil que fica na área de serviço; ele não fala, apenas toca os LPs que coloco no prato giratório. Aproveitei o fluir da música e fiquei pensando em minha condição servil aos objetos que habitavam minha casa.

Foi aí então que entendi, num vislumbre, que nossa sociedade vai se tornando diabética, cardíaca, estressada, cancerígena, reumática, paranóica, obesa, obsessivamente crônica e outras pérolas mais, enquanto que os objetos que trabalhamos para comprar continuavam fortes e vigorosos, cheios de saúde. Eles podiam ser trocados. Eu não, eu não podia me trocar por outro eu. Seria bom se pudéssemos entrar numa mega loja, tipo casas Bahia, e sair de lá com a posse de um outro eu, mais novo, mais calibrado e pago a prestações.

O pesadelo aumentou quando fui “tomado por uma súbita emoção”: que não só os objetos, mas as casas, os prédios das Igrejas, do Governo, as fábricas, tudo era mantido com o nosso desgaste físico, — inclusive formas de pensar que mais fazem mal do que bem. O resumo da ópera era trágico: minha saúde, toda ela, era canalizada para manutenção de um mundo que parecia sem sentido.

Quando estivermos mortos, todos de minha geração, e outros mais novos estiverem de pé sobre o planeta, os objetos que ajudei a construir e as formas de pensar que impulsionei, estarão vivos. Do meu corpo só restará o pó, mas as algemas que ajudei a construir - você também, caro leitor - estarão soltas pelo mundo, criando novos escravos e mais degradação do corpo humano.