quinta-feira, 5 de setembro de 2024

O fascismo 'informal', segundo Freud

 

Há uma constatação freudiana que parte do seguinte pressuposto: todo aquele que se sente inferior é vazio por dentro, se acredita desprezado, e logo tenta criar uma inversão 'idealizada' do mundo para que ele mesmo possa ser a salvação. Salvar essa sociedade 'vazia e corrupta', pela qual afirma lutar com unhas e dentes, como se fosse um chamado divino. E coincidência ou não, isso sempre ocorre às vésperas das eleições. Há quem acredite nesse delírio sociopata.


Bem, mas esse delirante 'sociopata' necessita não só de bodes expiatórios, mas da ressonância que seus delírios causam na sociedade. Até aqui podemos entender que foi assim no passado com hitler, mussolini, stalin, salazar, franco, mas hoje esse mesmo 'modus operandi' ocorre de maneira mais sofisticada e não menos perigosa, já que projeta o senso comum numa vertigem i-rracional numa busca por um 'i-mundo' digital pós-moderno neofascista. (o termo não é meu).


Ele deixa claro, pra quem o ouve e o segue, que o mundo necessita de uma automutilação para se purificar. é uma proposta ideológica que é o inverso da inclusão (diversidade), da universalização (estado democrático de direito) e do diálogo (dialética no debate político); mas é sim, com todo a sua força, sinônimo de exclusão (dos bodes expiatórios), de individualização (privatizações) e do consenso obrigatório daquele que se intitula líder (imposição de uma só retórica) - não à toa a campanha de bozonaro, em 2018, usava grupos de pessoas dançando sincronicamente, todos vestidos como se estivassem numa academia de ginástica, sem nada a dizer. Mas havia uma mensagem ali: "sim, todos nós, os indivíduos que aqui estamos, queremos dizer com nossos movimentos que 'somos componentes' de uma sistema e aderimos à essa ordem onde não é preciso se expressar, porque não precisamos pensar a realidade ao nosso redor, o líder o faz isso por nós".


Os gregos antigos chamavam aqueles que conheciam, de maneira geral, os problemas da polis (cidade) de políticos. E aqueles que não conseguiam enxergar os problemas, além da própria casa, de idiotas, ( do grego, idotez, alguém que é fechado em si mesmo e não se interessa pelos assuntos do Estado; aliás, já foi tema do ENEM) .


Mas voltando ao tema, o que me assombra é a resposta positiva de grande parte da sociedade a essa manifestação do 'idiotez', do vazio, da eterna presença do bode expiatório e do chamado de Deus embutidos nesse fascismo digital. são milhares/milhões que se sentem também insignificantes a ponto de seguirem essa patologia com orgulho e devoção. E isso independentemente se o líder é alguém que mal sabe falar, ou argumentar, como bozonaro, ou sé é um coch paraguaio tipo pablo marçal que já cometeu desde estelionatos à exploração da fé alheia, além da relação com o PCC, mas com uma eloquência e retórica teatral tipo hollywoodiana bem produzida. eis o mistério. será que é algo inato nas sociedades e vem esses aproveitadores e estimulam o pesadelo para proveito próprio? É algo indigesto por demais concluir que esses neo-fascistas fazem os zumbis caminharem com orgulho sobre a Terra. É algo desesperador. Trágico.


domingo, 18 de fevereiro de 2024

O fundo partidário - quando são aqueles que não produzem coisa alguma, mas que decidem o futuro da sociedade...

       



 As eleições municipais são manipuladas pelo fundo partidário. Bem, você pode pensar consigo mesmo, de onde vem tantos vereadores inespressivos, literais bananas, marionetes nas mãos dos executivos munipais? - Além dos aventureiros canditados ao cargo de prefeito. Isso é fruto do modo operandis dos partidos sem identidade que vivem no congresso à base de compra de votos em sua base, que vai do municipal ao federal passando pelo legislativo estadual. Por isso o Fundo partidário deve sempre ser aumentado. É também uma boa forma de se lavar dinheiro. Os comandantes das campanhas, nos municipios, se tornam figurinhas carimbadas em bares, gráficas, festas, contratações misteriosas que nada mais são do que lugares onde se lava esse dinheiro. Notas frias conseguidas a duras penas. 

 

        Mas não se preocupe, depois esse dinheiro é recuperado com o aumento de impostos. Por isso drones sobrevovaram sua casa bem no perído da pandemia, no qual tínhamos menos recursos para aumentar a arrecadação. Foi no governo bolsonaro que as câmaras municipais, a base de PSD, PFL, PP, Patriotas e derivados criaram-se leis orgânicas a baciadas autorizando a aferição por drones das áreas construídas. Uma profunda violação da privacidade, algo que deveria ser sagrado para todo partido que se diz Libral, mas enfim, vale tudo para arrecadar mais e ampliar o cabide de empregos das prefeituras. 

 

        Há quem diga que um hábito de prefeitos da região a compra de sítios e chácaras para que possam enterrar dinheiro vivo. O laranjal desses prefeitos, perfeitos seguidores da política do centrão, que nada mais é do que o bo e velho patrimonialismo, não para de crescer. Mas enfim, cuide-se. Não elelge vereadores sem expressões, esses de boca mole não mais são do que marionetes que forma eleitos pela compta de votos do fundo partidário. 
          Pense bem, pois você será a maior vítima desse processo.                   
 

     

quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

A ressurreição dos Reis




Foi logo nas primeiras horas do ano. Terminado o baile, mãos no bolso e cigarro de chocolate no canto da boca, que fui pelas ruas desertas em busca de uma água mineral, seria a primeira de 2024. A gente pensa nessas coisas depois do Revellion: a primeira água, a primeira porta que se abre, a primeira pessoa com quem se fala, etc.. Precisava encontrar um boteco aberto. Será, àquela hora, na primeira aurora de 2024? Enquanto houver botecos haverá esperança. E assim encontrei o meu, tal como um peregrino encontra um oásis num deserto.

Atrás do balcão havia um homem no formato de um ovo, careca, peitudo e barrigudo, que enxugava um copo com um pano de prato amarelado e engordurado, por isso pedi uma lata de cerveja (esqueci da água mineral). Gostei dele só porque me atendeu sem dizer o ‘feliz ano novo’ que tanto eu já tinha ouvido. Ele me deu a lata e eu paguei. Quando me virei para sair, no canto, três caras fantasiados discutiam sobre um pedaço de couro esticado sobre a mesa enferrujada. Turbantes, batas e potes estranhos. Um deles era negro. Olhei pro dono e ele me fez sinal de que não sabia do que se tratava. Achei que era o espólio de algum baile à fantasia, nada de anormal para o tipo de festividade que havia acabado.
Dessa vez eu fui o chato, me aproximei no intuito de ver mais de perto o que eram aquelas criaturas, e para isso usei o ‘feliz ano novo’ como disfarce. Todos olharam pra mim, tinham expressões tristes. Nos potes havia trigo, mirra e incenso. “Céus!”, exclamei alto, afinal estava à frente dos três Reis Magos, e pareciam mais perdidos do que cegos em tiroteio; o couro sobre a mesa era um mapa. O mesmo que usavam há dois mil e vinte quatro anos. “São vocês mesmos?” Todos confirmaram. Puxei uma cadeira e pedi outra cerveja ao homem ovo. Voltei para o trio e resolvi perguntar, “Qual é o problema, por que estão tristes?”

A resposta foi simples, há muito não encontravam o Menino Jesus. Quando chegavam os presépios já tinham sido desmontados. Quando encontravam um ou outro ainda em ato, era muito mais pela preguiça do proprietário do que desejo de espera pelos reis magos. Além disso, o menino também se mostrava impaciente. Não queria saber de trigo, mirra e incenso. Queria vídeo-games, celulares, computadores e/ou passagens para Disneylândia e lugares afins. Ou seja, os três reis magos eram obsoletos.

Gaspar deu um murro na mesa e disse, “É culpa do Papai Noel, aquele...”. De certa forma ele tinha razão, com o patrocínio de refrigerantes e apoio logístico de Hollywood, Papai Noel havia se tornado na grande estrela do Natal: filmes, desenhos, comerciais e logomarcas estimulavam muito mais o consumo do que o nascimento de um menino numa manjedoura, cercado por animais e presenteado, dias depois de seu nascimento, por três reis magos com presentes simbólicos.

Baltazar chorava, lembrou-se de São Francisco, “...e os pobres animais do presépio, todos viraram churrasco!”. Era fato: bois, cavalos, galinhas, ovelhas tornaram-se sinônimos de carne assada na brasa. Ninguém mais se lembrava deles no Natal, haviam aquecido o menino com seus corpos quentes, mas ninguém se lembrava mais deles, nem as crianças. Era trágico, Papai Noel com certeza era um funcionário da CIA, e sua função era fazer com que os homens do mundo pensassem como os norte-americanos; e maior sucesso teria a tarefa se ela começasse com as crianças. Natal é consumo.

Com as primeiras lágrimas nos olhos de 2024, resolvi comprar briga com Papai Noel em defesa dos três reis magos. Pensei numa guerra do tipo X-Man, mas os três sábios me dissuadiram. ‘Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade’ era o princípio básico do Natal, e não uma guerra. Eles tinham razão, então pedi outra cerveja ao homem ovo que deixou claro que estava ao nosso lado na futura cruzada contra o homem refrigerante que se chamava Noel.
Eu não agüentei e desabafei, “...vocês ainda andam de camelo e o Noel vai de helicóptero”. A concorrência era desleal. Mas a esperança não morre fácil. O homem ovo trouxe seu filho pela mão, ele morava nos fundos do boteco, além do balcão ficava não só a cozinha do bar, mas também sua casa.

Belchior sorriu pro menino e o colocou sobre o joelho. Do trigo dourado, (que muitos pensam ser o ouro, inclusive teólogos), emanou uma luz, ela pairava sobre a mesa. O menino sorria, eu e o homem ovo ficamos no lugar dos animais, de nós exalava calor. Da mirra e do incenso vieram aroma, limpeza, tudo ficou como a água pura da montanha. A singela mulher do homem ovo saiu detrás do balcão, veio até a mesa, beijou as mãos dos magos, tomou o filho de volta e os reis entregaram a ela os presentes.


Os reis se curvaram e saíram, o boteco parecia novo. Fui até a rua e me deparei com uma neblina nada comum nessa época, então vi a silhueta dos Reis Magos em movimento e até agora não consegui me esquecer do barulho dos pés dos camelos. Voltei pra mesa, dessa vez o homem ovo se sentou comigo, tinha os olhos úmidos. Encheu dois copos de cerveja e disse, “...é por conta da casa”. Agradeci, bebi e perguntei, antes de sair:
— Obrigado, senhor...
— ...José.