segunda-feira, 27 de abril de 2015

The song remains the same

O que não sabemos, afinal, dessa vida? Do começo, do meio e do fim, de resto, nada nos é estranho. O escuro da noite nos acalma, a luz cega os miseráveis e degradados filhos do sonho. Por que a ideia de que há um pai no céu me é indiferente? E nas poucas vezes que disse que amava alguém, nunca sequer pensei em algo transcendente. Mas o vento se vai e a cretinice dos que nos rodeia permanece. O trem clama pelo o homem velho e ele há de cruzar o deserto, minha eterna morada, a salvação em meio ao silêncio das criaturas, onde os fantasmas estão expostos ao próprio sofrimento.
E que venha o sol, de quem guardo um profundo pesar. Não posso dizer o que penso à luz do sol, seria assim uma profunda heresia despudorada, mas vamos tentar! Explicar, analisar, parece um desejo de querer parar o viver para contar o tempo e dizê-lo quântico, o que seria uma morte anunciada pela ânsia de não querer ser. Posso pensar que estou sempre indo e que não haverá ninguém pra me dizer o que devo fazer.
E se fizéssemos nossos cigarros nos textos sagrados? A fumaça seria benta, seríamos absolvidos da vida por algo metafísico, escrito com muita força de vontade e pouca inspiração. Deus, por que não toma uma cachaça? Por que não canta ao violão? Por que não se encanta por uma ninfa? Elas são lindas, traiçoeiras e nos abandonam sem vergonha alguma, e fica aquela sensação de que não há outra coisa a ser feita, pois o mundo todo é um viver triturado por uma constante despedida que não se acaba.
Vejo a imagem impressa na névoa, o corpo nu desenhado na áurea manhã dos dias descompromissados, o pão silencioso sobre a toalha da mesa, o desejo de dizer coisas que param o mundo e que não há nada pra fora do mundo, a casa é o mundo. Resplandece uma vontade de chorar, é que o corpo não consegue mais acompanhar as piruetas dos versos. E se eu dissesse seu nome por horas afora, um mantra, você apareceria pra mim como se fosse uma deusa e me amamentaria com o sabor de suas vísceras, com o aroma de seus desejos e ainda poderia dizer que me ama, mesmo que nunca tivesse sido verdade?
As janelas da casa se abrem prum imenso descampado verde. Até no mais longínquo horizonte há uma ausência de árvores, nenhum anjo com o fruto da queda em suas mãos procura por mim. Eu queria ir mais a fundo e arar a terra e saber dos vermes que ressuscitam os corpos mortos, saber, pelos olhos, que amar é como morrer para a canalhice do mundo. Um mundo obtuso, feito de parafina, plástico, ofício e sorrisos falsos. – Os medíocres clamam pelo meu fim.
O jantar numa praça árcade, meus pés pisam papéis de chicletes falsos. O vento é santo, santo, santo e é livre de todos os nós e apenas às velas dá significado. O mar, o mar, o mar e o penhasco de Gibraltar. César, Pessoa, quem disse que navegar é preciso? Só a estrada nos abençoa, nos purifica, redime, nesse turbilhão de céu vazio. Seguimos em frente, assim, sem medo, apenas o sol nos impede, às vezes, de dizer coisas do fundo do peito. A Terra é azul, e tudo permanece o mesmo de sempre. Melhor escrever canções. 
Olho pro oeste, a noite vem, um vulto cinza e negro temperado à necessidade de entender que não há morada possível no giro enfático da terra. Os tambores soam ao longe, preciso dizer num dia desses, em pleno sol, que tudo é passageiro, mas que enquanto rola no sangue, há estragos. Preciso brindar com Bukowsky, alguém que soube morrer com dignidade.




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